Conversamos com uma especialista na área para entendermos as diferenças e semelhanças dessa nomenclatura que envolve crianças entre 2 e 9 anos.
Por Marcela Benvegnu | [email protected]
Muito se fala sobre baby class e ballet infantil. Tem gente que acha que essa divisão é só uma questão de idade, outros só de nomenclatura. Mas existe sim, muita diferença entre um e outro. Para podemos entender um pouco mais desse universo, suas potências, fragilidades, semelhanças e diferenças fomos conversar com uma especialista no tema: Paola Bartolo. Ela, que é professora de ballet clássico, formada pela Escola Municipal de Bailado de São Paulo, dirige o Núcleo de Qualificação para Professores e é especialista em baby class e ballet infantil. Para isso foi estudar anatomia, fisiologia, cinesiologia, pedagogia, psicologia e neurociência. Paola é hoje uma referência brasileira quando falamos e pensamos em dança clássica para crianças. Além de rodar o Brasil com seus cursos de qualificação é pós-graduada em Educação, Saúde Pública e Psicomotricidade, formada em Reeducação do Movimento pela Escola de Ivaldo Bertazzo e integra o grupo de estudos da Dança da Universidade de São Paulo (USP). Diretora artística do Seminário de baby class e ballet infantil de São Paulo prepara para janeiro de 2019 a realização do 1º Congresso Internacional de Baby Class e Ballet Infantil. Como ela diz: “O ballet de amanhã é o que a gente constrói hoje”. Confira abaixo sua reflexão sobre o tema.
SOBRE O TEMPO
“Antigamente as crianças começavam a fazer aulas de ballet aos 9 anos, depois fomos para 7 anos. Com essa idade a criança já tem a sua questão física constituída, tem predominância da lateral, fala direito, expressa sentimentos, escreve. Ela tem uma identidade física e emocional mais definida, cria respostas e está pronta para trabalhar seus grupos musculares. O que aconteceu é que com o advento da contemporaneidade, a mulher trabalhando fora, o surgimento dos berçários, escolas de tempo integral, a idade para o ballet começou a cair, porque a criança fica o dia todo na escola e tem que fazer atividades. Assim começamos a dar aulas para crianças de 4 anos, depois 2 anos. Porém, a criança só tem consciência, controles neurais do sistema nervoso central depois que ela desfralda e se ela não tem maturidade, não tem controle do corpo e qualquer coisa que ela fizer passa a ser imitação e não aprendizado. É aí começamos as diferenças entre baby class e ballet infantil”.
[rock-convert-cta id=”2909″]
BABY CLASS
“Baby class é o ensino da arte e familiarização da técnica clássica. A aula parte da memória afetiva, esse é o vínculo da criança com o ballet, uma memória primária. É quando ensinamos a criança a se relacionar. Se o seu timbre de voz for alto, por exemplo, ela aprende que balé é isso. A aula de baby class deve ser a aula do encantamento, do ballet do amor. O modo como eu vou falar, o tempo da sílaba, tudo faz diferença. Por isso é preciso muito estudo na área de desenvolvimento infantil. As crianças de hoje não são mais Cinderelas, elas também querem outros papéis. O que acontece é que as pessoas mandam nelas o tempo todo, a escola diz onde ela tem que ficar e o que tem que fazer e quando ela vai para o lúdico ela pode se libertar, pode buscar uma identidade que vai ser diferente da sua amiga. Nessa aula é preciso construir o seu senso de individualidade, sem repetição. Ela precisa explorar o corpo, perceber o volume, os sentidos, ossos, pele, quem é ela. E claro, que nosso papel é criar histórias dentro do contexto delas, com pantomimas. A criança pequena não tem elaboração e nos cabe construir memória, gosto pela música, delicadeza, gentileza. Um exemplo: se eu digo para elas, peguem o pandeiro. Ela escolhe com que mão quer pegar, eu não fui lá e peguei primeiro ou para ela. O estímulo parte dela e desta forma eu não interfiro no processo de definição da predominância lateral da criança”.
BALLET INFANTIL
“Quando essa criança já chega aos seus 6, 7 anos, que já sabe escrever, que tem um sentido de corpo, começamos a familiarizá-la com a técnica clássica. E esse trabalho técnico vem sem manipulação, ela vai percebendo a musculatura, sentindo a rotação… É um trabalho de educação psicomotora de percepções, da cabeça do fêmur e aos poucos ela capta as movimentações. É o tempo de trabalharmos autonomia, como por exemplo colocar a sapatilha sozinha, de trabalharmos sensações, como por exemplo, a expectativa de entrar no palco. Com a criança de até 4 anos, você se relaciona com ela e depois dos 7 anos, ela já tem senso crítico de escolha e isso interfere na sua relação, e claro, na sua aula. Temos que construir o seu corpo para que ela entenda o movimento, e não simplesmente o reproduza. Se ela não tiver consciência do seu corpo, da sua potência, a mera reprodução estética não adianta. Por isso falo que encantar é diferente de gostar. Eu preciso que ela goste, mas antes tenho que encantá-la. Estamos hoje perdendo referências de estudo, machucando corpos. Isso não pode acontecer, insisto cada vez mais no estudo, na ideia de aprender a pensar corporalmente, pensar realmente a finalidade do que você está fazendo”.
⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀ ⠀⠀⠀⠀⠀⠀
PROFISSIONAL
“Esse professor de baby class ou ballet infantil de hoje, precisa ter uma formação física, entender de psicologia, de desenvolvimento infantil, motricidade. Ele precisa saber como se relacionar com a criança. E lembrando que podemos ser professoras incríveis e não necessariamente bailarinas incríveis. São ofícios diferentes. É preciso pensar sem fórmula. Entender o caminho, o estímulo, quebrar os paradigmas e ver todas as possibilidades que a aula e o corpo da criança te dão. São inúmeras. É muito difícil dar aula para crianças. Precisamos entender realidades culturais antes de entrar numa sala de aula, no Nordeste as crianças andam muito mais descalças do que no Sudeste e isso muda a sua relação com o corpo. O aprendizado é diferente, o ritmo, o vínculo com a dança. É preciso ensinar e validar. Ver o rendimento, a progressão. E se é preciso, retroceder. E de novo, validar. Eu sou uma apaixonada por ballet, por criança, por estudo. A gente não para, tem atualização o tempo inteiro, porque o ballet de amanhã é o que a gente constrói hoje”.
[rock-convert-cta id=”2917″]
Sem Comentários