Às vésperas de assumir a curadoria do Prêmio Desterro, ele conversa conosco sobre sua trajetória, música e seu olhar a frente da ETBB. Confira.
Por Marcela Benvegnu | [email protected]
Pavel Kazarian adotou o Brasil como casa em 2001. Chegou para ficar uma temporada como correpetidor na Escola do Teatro Bolshoi no Brasil (ETBB) “emprestado” do Bolshoi de Moscou. Se apaixonou pelo pela cidade, pelo país. Ficou. Em 2007 assumiu o cargo de diretor geral da ETBB e este ano a curadoria de um dos mais importantes festivais de dança do país: o Prêmio Desterro, que acontece em Florianópolis, Santa Catarina. Figurinha carimbada como jurado no Dança do Famosos, da Rede Globo, em 2016 e 2017, ele conta um pouco da sua trajetória nesta entrevista e revela um olhar generoso com os bailarinos que trabalha, seja na escola, ou na Companhia Jovem da ETBB. Confira.
Como começa sua carreira nas artes?
Comecei a estudar piano aos 4 anos. Aos poucos fui trocando a escola de música pelo Conservatório. Foi algo natural. Quando eu tinha aproximadamente uns 15 anos, comecei a fazer alguns trabalhos com dança, engraçado que os primeiros foram com dança contemporânea, depois também com algumas coreografias de George Balanchine. Depois de formado fiz alguns trabalhos solo e prestei o concurso para o Teatro Bolshoi de Moscou para a vaga de pianista correpetidor. Fui o pianista mais jovem contratado pelo Bolshoi da Rússia, tinha 17 anos.
E como era esse trabalho com o Bolshoi?
Eu tocava os balés novos e durante as viagens também tocava nas aulas. Foi um mundo mágico porque sempre gostei muito de dança e nesse momento eu pude trabalhar com grandes artistas e estrelas desta arte. No Teatro Bolshoi participei de concertos e turnês da companhia, trabalhando com grandes nomes internacionais da dança, entre eles Suzanne Farell (New York City Ballet), Nina Ananiashvili (American Ballet Theatre e Teatro Bolshoi) e Vladimir Vasiliev.
O que você mais gosta de tocar?
Eu não tenho compositor preferido, mas a música sempre me acompanhou a vida toda. Mesmo nos momentos mais difíceis, com muito trabalho, pressão, a música era um alento, e eu continuava tocando piano.
Mas sabemos que você é compositor, inclusive você foi autor da versão musical e regente da orquestra na estreia da suíte do ballet “O Quebra-Nozes” da ETBB, com coreografia de Vladimir Vasiliev.
Desde que me conheço por gente, sempre compus. Fazia as minhas próprias músicas. Eu tenho um caderno, com algumas composições minhas, que escrevia com 4 anos de idade (risos). Mas eu sempre tive muita vergonha de mostrá-las. Com o nascimento do meu filho percebi o grande legado que eu poderia e vou deixar a ele: as minhas músicas eternizadas.
E você veio para o Brasil a convite do Bolshoi. Como isso aconteceu?
Em 2001 vim para Brasil pela primeira vez. Fui cedido pelo Teatro Bolshoi de Moscou, para a única filial do Bolshoi fora da Rússia, em Joinville, Santa Catarina, inicialmente por uma temporada para exercer o cargo de pianista. Vim sem a pretensão de ficar muito tempo. Gostei muito do país, do Estado e da cidade de Joinville. O mais bacana é que em uma escola você vê o trabalho diário e isso vai se multiplicando quando os alunos crescem porque temos uma responsabilidade que vai além dele entrar no palco. É diferente de um trabalho de companhia, por exemplo, que você chega, toca e vai embora. Eu acabei ficando por aqui e no ano seguinte e assumi a coordenação do Núcleo Musical da Escola. Foi em 2006 que fiz “O Quebra-Nozes”, que (mencionado acima) e, em 2007, em comum acordo entre o Conselho da Escola Brasileira e o Teatro Bolshoi de Moscou, assumi o cargo de diretor geral do Bolshoi Brasil.
E sob que perspectiva você dirige a ETBB?
Muitas pessoas acreditam que a Escola do Teatro Bolshoi no Brasil tem muitos recursos; mas na verdade, passamos por enormes dificuldades para manter 100% de gratuidade no ensino para todos os alunos. Continuar a oferecer aprendizado de qualidade, ter mais de 72% de alunos formados empregados na área de dança – é um motivo de orgulho para todos que lutam diariamente pela existência da Escola do Teatro Bolshoi no Brasil. Dirijo a Escola aberto ao mercado nacional e internacional e continuo oferecendo um ensino de qualidade, pois percebo o grande interesse pela dança por parte da juventude.
Que tipo formação você deseja que esses jovens tenham na dança?
Penso que o objetivo de toda escola profissionalizante é o de ver o aluno que passa por ela resolvido profissionalmente. É sentir que a Escola e seus mestres buscaram desenvolver ao máximo o potencial deste aluno. E queremos que ele se lembre do tempo que passou em Joinville, no Bolshoi, com saudades, com alegria – assim conseguiremos alcançar o nosso objetivo verdadeiro: ensinar com determinação e formar verdadeiros cidadãos.
Conte um pouco da Companhia Jovem ETBB, que inclusive, está completando dez anos em 2018.
O objetivo dessa companhia é o dar uma primeira experiência profissional para esse jovem. Muitas companhias pedem bailarinos com experiência e existe uma lacuna grande do jovem que sai da escola e o bailarino profissional experiente. A proposta da Companhia Jovem ETBB é manter-se ativa em apresentações públicas constantes; seus artistas devem atuar como agentes formadores de plateia e incentivadores de novas vocações. Costumo dizer que é uma Companhia de passagem. Eles passam por aqui e depois vão para o mundo. Começamos com cinco bailarinos e agora temos 15.
Você acaba de assumir a curadoria do Prêmio Desterro, de Florianópolis, que acontece de 28 de agosto a 2 de setembro. O que deseja e espera desse evento?
Sempre olhei o Desterro com muito carinho e os bailarinos sempre falam muito bem dele. O Bolshoi já abriu uma vez o festival e foi ótimo. Quando recebi o convite aceitei porque sei que o evento ainda pode crescer muito. Hoje temos muitos festivais e o que eu espero é que eu consiga destacá-lo com coisas positivas. Quero que as pessoas desejem ir para Florianópolis. E esse festival pensa no bailarino, tudo é voltado para ele.
E como foi Perm? Você foi jurado do Concurso Internacional de Balé XV Russian Open Ballet Competition “Arabesque 2018” – Ekaterina Maximova, um evento que inclusive já tem parceria com o Desterro.
Foi excelente. E a melhor notícia é que cinco dos nossos bailarinos – Maitê Nunes (RJ), Luanna Gondim (PE), Marcos Yago (PA), Gabriel Lopes (SP) e Sayron Alves (SP) – receberam um contrato como solistas para o Teatro de Ópera e Ballet de Perm. Eles se formaram em 2016 pela Escola Bolshoi e agora estão na Cia. Jovem. O diretor de lá agora no mês de julho enviará dois professores (Natalia Moiseeva e Vitaly Poleshuk) e dois bailarinos (Polina Buldakova e Nikolay Lancev), da Cia. de Perm, para preparar os bailarinos para os balés O Lago dos Cisnes e Romeu e Julieta, que estreiam em setembro. É uma enorme satisfação.
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ENTÃO CONFIRA AS CURIOSIDADES ABAIXO!
A ESCOLA | A Escola do Teatro Bolshoi no Brasil é a única extensão do Teatro Bolshoi no mundo e pela primeira vez, o Teatro transferiu a outro país o método de ensino de balé que o tornou uma das mais respeitadas instituições do mundo. Ela foi criada no dia 15 de março de 2000, em Joinville, Santa Catarina. A sua missão é formar artistas-cidadãos, promovendo e difundindo a arte-educação.
ALUNOS | A escola educa 220 alunos, vindos de 22 Estados Brasileiros e 3 países e concede 100% de bolsas de estudo para todos os alunos do curso técnico. Além de ensino gratuito, os alunos recebem benefícios como alimentação, transporte, uniformes, figurinos, assistência social, orientação pedagógica, assistência odontológica preventiva, atendimento fisioterápico, nutricional e assistência médica de emergência/urgência pré-hospitalar. Para isso devem apresentar bom rendimento na Escola Bolshoi e também no ensino médio e fundamental, pois a ausência de boas notas implica na perda da bolsa de estudo no Bolshoi.
DISCIPLINAS | Na ETBB os alunos aprendem: dança a caráter, clássica, contemporânea, popular histórica, danças brasileiras, dueto, educação musical, ginástica acrobática, ginástica específica, história da arte, história da dança, iniciação à pesquisa, literatura musical, piano, prática cênica, repertório, rítmica e teatro.
FORMAÇÃO | A Escola já formou 320 bailarinos e 72% estão atuam na área da dança pelo Brasil e Exterior. A empregabilidade relaciona-se com a realidade de todo e qualquer profissional. Atualmente 79 jovens trabalham no Exterior, 10 estão na Rússia, país sede do Teatro Bolshoi.
ESPAÇO | O complexo da ETBB é formado por salas para aulas de balé, estúdios de música, ateliê, núcleo de saúde, biblioteca, cantina, espaços culturais e dois laboratórios cênicos. Conta com 14 professores e nove pianistas, sendo seis professores russos.
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